quarta-feira, 25 de março de 2009

O FABULOSO MUNDO IMAGÉTICO DE JEAN-PIERRE JEUNET E MARC CARO

“O sensível não é feito de coisas. È feito de tudo que nelas se desenha, mesmo no vazio dos intervalos, tudo que nelas deixa vestígio, tudo que nelas figura, mesmo a título de desvio e como certa ausência: o que pode ser apreendido pela experiência no sentido originário do termo, o ser que pode dar-se em presença original.”
Merleau-Ponty


Filmografia:


DELICATESSEN. Título original, Delicatessen,Comédia,França 1991.Direção:JeanPierre Jeunet e Marc Caro.Cinematografia, Darius Khonoji. Montagem: Herve Schneio.Roteiro:Jean Pierre Jeunet,Marc Caro e Gilles Adrien .Musica original:Carlos D’Alessio,Elenco principal:Dominique Pinon,Marie-Laure Douganac, Jean-Claude Dreyfus,Karin Viard, Rufus e Tick |Holgado. Universal Studio. Duração:95 minutos.Colorido.Legendas em Prtuguês,Espanhol e Coreano.Idiomas dublados:Português,Francês.Distribuição no Brasil Studio Canal.Longa metragem.DVD/VHS

LADRÃO DE SONHOS. Título original: La cite dês enfants perdus,Aventura.França, Alemanha,Espanha, 1995. JeanPierre Jeunet e Marc Caro.Roteiro:Gilles Adrien,Guilaume Laurant, :JeanPierre Jeunet e Marc Caro.Elenco principal:Ron Pearlman,Daniel Emilfork,Judith Vittet,Dominique Pinon,J. Claude Dreyfus,Música: Ângelo Badalamenti.Diretor de fotografia:Darius Khonuji.Editor de som:Gerard Hardy.Cenografia:Jean Rabarse.Direção musical: Vincent Arnardi e hierry Lebon.Efeitos especias:Piotf e Pierre Buffin. Produção: Daniel Szuster.Produzido por Claude Ossard.Co-produção:Constelation, Lumiere,Le Studio anal.108 minutos.Impróprio para menores de 16 anos.Universal Picture.Legendas:Português, Espanhol,Coreano.Audio:Francês.VHS/DVD.



O FABULOSO DESTINO DE AMELIE POULAIN.Título original: Le fabuleux destin d’Amelie Poulain.França, 2001.Comédia,Direção: JeanPierre Jeunet,
Tempo de Duração: 120 minutos,stúdio: Le Studio Canal+ / Filmstiftung Nordrhein-Westfalen / France 3 Cinéma / La Sofica Sofinergie 5 / MMC Independent GmbH / Tapioca Films / Victoires Pictures
Distribuição: Miramax Films,Roteiro: Jean-Pierre Jeunet e Guillaume Laurant.Produção: Jean-Marc Deschamps.Música: Yann Tiersen.Ftografia: Bruno Delbonnel.Desenho de Produção: Aline Bonetto
Direção de Arte: Volker Schäfer.Figurino: Madeline Fontaine e Emma Lebail.Edição: Hervé Schneid
Efeitos Especiais: Duboi...
Audrey Tautou (Amélie Poulain)
Mathieu Kassovitz (Nino Quincampoix)
Rufus (Raphael Poulain)
Yolande Moreau (Madeleine Wallace)
Artus de Penguern (Hipolito)
Urbain Cancelier (Collignon)
Maurice Bénichou (Dominique Bretodeau)
Dominique Pinon (Joseph)
Claude Perron (Eva)
Michel Robin (Pai de Collignon)
Isabelle Nanty (Georgette)
Clotilde Mallet (Gina)
Claire Maurier (Suzanne)
Serge Merlin (Dufayel)
James Debbouze (Lucien)Lorella Cravotta (Amandine Poulain)
Flore Guiet (Amélie Poulain - 8 anos)


[...]A instabilidade imagética e da lógica nos filmes da dupla, provocam no espectador além da experimentação do desalinho intelectual, também, leva a outras sensações como náuseas, repulsa, ternura. Por não comportar uma lógica palpável, o observador pode ser provocado a uma nova visita as obras. A disposição induzir o observador a uma experiência onírica, onde situações estranhas remetem ao mundo dos sonhos, é uma marca deixada pelos diretores. No caso em especial de “Delicatessen e La cite”, nem o literal representa o real, nem o real projeta o literal. O real desnaturalizado não se reproduz por inteiro devido às situações colocadas em todo decorrer das histórias.
As três obras remetem ao sonho, o que faz lembrar uma citação de Merleau-Ponty em Fenomenologia da Percepção onde ele afirma que “O sonhador sonha, é por que seus movimentos respiratórios e suas pulsões sexuais não são tomados por aquilo que são, rompem as amarras que os ligam ao mundo e flutuam diante dele sob forma de sonho.[...] os objetos estão sempre ali, com o espaço claro ele conserva sempre o meio de exorcizar os fantasmas e de retornar ao mundo comum.”. Assim se desenrola os trabalhos cinematográficos da dupla de diretores. Dão ao observador a oportunidade segura de ir ao mundo dos sonhos por um tempo e serem acordados pela luz que se acende na sala de cinema ou o desligar de um botão de controle remoto.
Seqüências coreografadas permeiam as obras. Destacam-se em Delicatessen e Amelie Poulain momentos memoráveis. Na primeira obra as seqüencia das cenas do momento de amor do açougueiro e sua inquilina que fazem todo o edifício entrarem em sintonia com seus movimentos, a graça do ex palhaço , faz-tudo interpretado por Dominique Pinon, (ator presente nas três obras e em La cite dês enfants perdus é um ser clonado em seis outros) dança com suas três pernas, a seqüencia da manutenção das molas do colchão são de um humor e delicadeza únicos. Em Amelie Poulain, destaca-se a fugaz, mas não menos poética travessia do homem cego onde Amelie descreve a ele todos os elementos e detalhes da rua que ela julga ser interessante de se ver como, por exemplo, as rugas do sorriso do florista, a viúva do instrumentista da banda que usa a farda vermelha desde que ele morreu o detalhe da cabeça da estatua do cavalo que perdeu uma orelha, os pirulitos na vitrine da padaria, o bebe olhando o cachorro enquanto o cachorro olha a máquina de assar frangos e isso como uma paleta de cores torna a percepção do cego mais iluminada. O olhar do cego esta diretamente ligada a um conceito de perda da experimentação de ver, onde a princípio ver é somente uma mera ordenação daquilo que passa sem reparo, que é o que acontece de forma muito comum com todos que passam todos os dias no mesmo local, mesma cidade. O cotidiano pode cegar para os detalhes. Em relação à cegueira ou falta do olhar, enclausurar uma imagem produz outra imagem. O que remanesce, o que fica depois de tudo, quando a imagem desaparece em sua própria característica efêmera acaba por se modificar, tomar novas formas, novas cores que vai além do objeto concreto. Amelie gosta de ir ao cinema e olhar o rosto dos espectadores do filme e gosta de descobrir detalhes do filme que ninguém mais percebe. Com esse olhar treinado para ver o que é incomum, ao descrever todo um cenário ao homem cego, Amelie recortou imagens e permitiu que ele entrasse em outra dimensão de ver, um novo mundo percebível.
Em contrapartida logo no início de ”La cite dês enfants perdus” o cego fala à multidão que o cerca: “renunciem a visão”. Há personagens que são denominados de cíclopes, cegos com um olho mecânico que é chamado de terceira visão, visão esta, dada determinadas pessoas de uma espécie de irmandade onde o chefe fala a uma platéia de cegos, muitos com o olho mecânico. Esse suposto líder fala aos cegos que, veio ao mundo de olhos abertos e incita a platéia a renunciar o mundo das aparências mundo esse que o terceiro olho os permitia acessar. As conexões conceituais estão implícitas por toda obra, as definições ocultas, as explicações subentendidas, mas, no entanto elas estão fragmentadas por jogo de imagens e mini cenas que vão saltitando de um lugar para o outro narrando várias histórias que são entre ligadas , hora por encanamentos que permitem que os sons reverberem pelo prédio (Delicatessen), hora, por um personagem clonado seis vezes, crianças, seres mutantes e surreais,(La cite dês enfants perdus), poética sobre o cotidiano e a forma sincronizada que o mundo se move onde ao mesmo tempo o vento sopra sob a toalha de uma mesa e faz taças dançarem, uma mosca voa, um espermatozóide atinge o óvulo ou casais chegam ao orgasmo ( Amelie Poulain).
As distorções de imagens também muito usadas como linguagem nos filmes imprimem por vezes humor, outras angustiam.
A linha tênue entre o grotesco, surreal, delicadeza, leveza e humor permeia todas as três obras que fazem ponte de ligação e gravam as digitais estéticas dos diretores.
Quanto a ler imagens, segundo Didi-Hurberman, não no sentido de desvendar ou decifrar, mas no sentido de retrabalhar a imagem ler, conduzir e criar novas imagens que não funcionam com a mesma lógica do ver comum, mas, pode jogar com essas ultimas.
• As surpresas reservadas nas obras desses diretores não são menores que estranhamento e questionamentos que delas provem onde o pensamento Merleau-Pontiniano cujo “O conhecimento inteiro e o pensamento inteiro vivem de um fato inaugural cuja expressão é: senti.” Ter relação com o coerente, o real, palpável é a menor preocupação de quem faz uma obra imagética.
São três contos de fadas, e como tal, reviram imaginário infantil, lembranças, medos mais remotos, estranhezas. Anões, mutilados, palhaços, papel Noel, gente idosa, animais repulsivos, a falta de sensibilidade dos adultos em perceber a carência afetiva, amigos imaginários, a magia, os prazeres e devaneios da infância, são elementos incrustados nessas obras que culminam com a beleza de gestos contrapondo a feiúra. A inteligência vencendo o poder da força. O altruísmo sobrepondo a falta de carinho (La cite dês enfants perdus), a poesia do dueto de Cello e serrote com as crianças no telhado (Delicatessen) e a decisão de tornar o mundo a sua volta mais feliz com o degustar dos pequenos prazeres da vida (Le fabuleux destin d’Amelie Poulain), momentos recolhidos da memória de cada um que assiste as obras, devolvem por fim a poesia ao expectador. O delicioso triunfo do bem contra o mal. Coisa de contos de fadas.[...]"

FONTE:
(Esse texto é um fragmento do ensaio O FABULOSO MUNDO IMAGÉTICO DE JEAN-PIERRE JEUNET E MARC CARO - escrito por Eliana Maria L.S. Andrade em Novembro de 2008-FADM-Faculdade de Artes Dulcina de Morais)