domingo, 13 de janeiro de 2008

As meninas


Quatro meninas.
Tão diferentes entre si.
Cada uma com sua graça, beleza, inteligência, temperamento peculiar.
A diferença sempre empresta um charme a mais em todas as coisas e não é diferente com as pessoas.
A amizade começou na segunda série primária.
Sol era um pouco mais velha, bonitona.
Logo cedo desenvolveu corpo de mulher.
Era alta em comparação a amiga.
Possuía um jeito maternal, descolado, sabia de coisas que a amiga não sabia.
Era de uma família de varias irmãs mais velhas e um irmão caçula, portanto era a assessora para temas como namoros e afins.
Possuía preciosas informações sobre beijos e assuntos do coração.
Um dia,na terceira série primária, em uma tarde atípica, a professora discutia com a turma a nova lista de apagadores de quadro negro, (na época já era de cor verde).
A professora resistente ainda a chamava de lousa e sabiamente tomou a decisão de agendar os "ajudantes" pois o caos havia se instalado na sala.
Haviam brigas e desavenças durante a aula por conta do tal apagador. Todos queriam apagar o quadro.
Era uma honra ajudar a professora tão querida.
Em meio a essa confusão, eis que chega a diretora e logo atrás um menino.
Era muito bonito, alto para o padrão normal dos meninos da terceira série. Possuia cabelos loiros cacheados cortados curtos, grandes olhos azuis e um belo sorriso.
A professora deu boas vindas e disse: “Sente-se aqui nesse grupo da frente.’ Foi acomodado ao lado de Sol e sua amiga. “Estranho se sentar com um menino”,pensou uma das garotas. "E o moleque chegou mudando as coisas.” completou o pensamento. Era a tradicional idade do clube da Luluzinha e do Bolinha.
Ao ser apresentado a turma ,o menino tinha praticamente o mesmo nome da amiga de Sol.
UMA MENINA?!
Sim, era uma bela menina de Santa Catarina. Raro ver uma menina de cabelos tão curtos em época que a onda hippie ainda fazia sucesso. Raro ver uma menina loira de olhos azuis numa ciadade em que quase todo "candango" veio do Sudeste ou Nordeste.
A partir desse dia o grupo havia ganhado seu terceiro membro e também a mentora intelectual dos futuros planos infalíveis.
Eram, portanto, Sol a madura, Nana( a desenhista da turma) , Nane a loira que tinham em idade somente 4 dias de diferença da morena.Duas escorpianas juntas.
Na semana da criança,neste mesmo ano a morena passou pelo momento mais constrangedor de toda a vida. Ganhou um concurso de rainha da primavera na escola. Cada sala deveria escolher uma menina bonita. Sob protesto da mesma,mandaram-na ao concurso. Vestia uma espécie de bata indiana branca, com bordados na gola nas mangas compridas e barra. Cabelo longo, negro e liso abaixo da cintura com margaridinhas fixa em tranças fininhas, caprichosamente feitas pela mãe.
Era moda em 1973.
Teve de dançar com um menino que já estava na quinta série e havia ganhado o título de Rei.
Ben - Michael Jackson era o tema musical do momento.
A timidez extrema da pobre menina quase a fez desmaiar de vergonha sob os olhares de toda a escola.
Este foi o ultimo ano de concursos de beleza assim, espontâneos, com voto popular.
Nos anos que se seguiram ganhava a rainha que vendesse mais votos. Acabou a inocência, a única manifestação democrática que possuíam na escola. Era tempo de ditadura militar.
Havia uma alegria e inocente em poder expressar a vontade atravez de voto.
Entrou a corrupção e o poder financeiro na brincadeira.
Pais corujas investiam verdadeiras fortunas (pelos menos para as crianças era uma fortuna), na compra de votos para ver suas filhinhas na festa, coroadas.
Deprimente...
1973 foi uma ano que marcou a todos que moravam em Brasília/DF.
A morte da Ana Lídia Braga apagou a áurea de lugar especial e tranquilo que Brasília era envolvida. O terror havia chegado. Mães e pais ficaram neuroticos por segurança. Crianças, não brincavam mais nas ruas como antigamente...
Brasília passou ser uma cidade como qualquer outra depois disso!
A quarta menina só se juntou ao grupo na sexta série. Era um anjo de ternura. Por isso ao nascer recebeu um nome equivalente.
Parecia-se fisicamente com a Narizinho do “Sitio do pica-pau amarelo”. Tinha a mesma doçura da Rosana Garcia, a atriz que fazia este papel na época. Era a intelectual do grupo. Na verdade era fera em matemática, um dos requisitos básicos para se chamar alguém de inteligente. Ainda bem que isso hoje mudou um pouco.
O grupo estava formado. Viveram muitas aventuras .
O tempo passou ,cada uma foi pro seu lado.
Das quatro meninas, 3 se tornaram professoras assim que sairam do nivel médio.
A morena em Artes, a loura e a Narizinho em Letras.Sol casou-se e foi mãe cedo.
As outras três amigas foram mães pela primeira vez praticamente no mesmo ano entre 90/91.
Sol terminou seu curso superior recentemente, é artesã de mão cheia e seu filho já é adulto .
Hoje, são quatro quarentonas com muita personalidade e talento.
Quatro histórias de vida e lutas, mas as meninas ainda estão ali,vivas.
No fundo, quanto as pessoas mudam pouco do que eram quando crianças. Só aprimora-se o que já estava latente desde cedo.
Reencontraram-se oficialmente no orkut.
Todas as lembranças da infância estão fresquíssimas.
Planejam um encontro.
Pelo menos no espaço virtual estão pertinho.
Viva a NET!

4 comentários:

Murdock disse...

Isso é legal mesmo, já reencontrei amigas e amigos pela internet. Sem falar nos que fiz por aqui rsrs.

Anônimo disse...

Legal essa forma lírica e proustiana de relembrar os bons momentos vividos no passado, mas e que é parte essencial da sua história de vida. São memórias de uma vida vertida em palavras ao sabor dos deliciosos biscoitos com chá de outrora. Ítalo

Ângela disse...

Uau, Nana, chorei!
Você sempre mexendo com a emoção da gente.
Sabe, há poucos dias, em viagem, minha filha falando sobre a falta que estava sentido dos amigos, me lembrei do quanto era bom estar junto das minhas amigas quando eu tinha a idade dela. Que saudades!!!
Obrigada por existir, Nana, por ter me deixado compartilhar da sua presença e afeto (você não faz idéia do quanto isso significa pra mim!) Obrigada por "pra todo o sempre guardar o nosso lugar" no seu coração. Você sabe que tem lugar cativo aqui no meu também.
Beijo grande da sua amiga Narizinho.
PS: "Intelectual"?!! Ô bondade.

Ângela disse...
Este comentário foi removido pelo autor.